– Para ensinar leitura

3.2  Para ensinar leitura

.Consideramos a alfabetização sob os quatro tópicos de leitura, ortografia, compreensão e composição mas, como você verá, algumas técnicas podem ser usadas em várias áreas.

Antes de prosseguir nessas técnicas, sugerimos dois princípios para evitar que as crianças com dislexia caiam na armadilha de um ciclo de fracasso com a língua escrita.

 

3.2.1  Trabalhar ‘na estrutura’

Um método multissensorial usado entre outros no Dyslexia Institute Learning Programme from Dyslexia Action, UK (Programa de Aprendizagem do Instituto de Dislexia da Ação Dislexia, RU) é o de ‘trabalhar na estrutura’. Consiste em apresentar apenas aqueles materiais (palavras e orações) cujos componentes (‘sons’ e ‘letras’) já foram ensinados usando ligações multissensoriais.

A progressão estruturada beneficia todo mundo. Ela forma um contrato tácito através do qual as crianças não serão solicitadas a fazer algo para o que elas não adquiriram o conhecimento requerido. Elas não serão colocadas numa situação de fracasso.

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 3.2.2  Usando instrumentos de autocorreção

 Uma forma de você não ter que mostrar às crianças seus erros com uma ‘caneta vermelha’ é  prover um meio de autocorreção à medida que elas progridem.

Isso evita colocar as crianças em situações de fracasso nas quais você, como professor, teria que lhes dizer: ‘Não, errado!’.

Permitir às crianças encontrar e corrigir seus próprios erros as torna responsáveis  para com sua própria aprendizagem . Isso alimenta:

  • a auto-confiança: ‘Eu posso fazer.’
  • o desenvolvimento da motivação intrínseca ao invés da motivação extrínsica:
    ‘Eu quero aprender para meu próprio bem.’
  • autonomia:  ‘Eu preciso dominar minha aprendizagem .’ ‘Quais instrumentos vão me ajudar a fazer?’
  • metacognição: ‘Agora eu sei como evitar fazer o mesmo erro da próxima vez’

As folhas de autocorreção podem ser facilmente preparadas para rastrear ou discriminar os exercícios. Peça aos alunos para checarem se eles encontraram todas as ‘letras’ ou imagens, por exemplo, sobrepondo as duas folhas de papel e segurando-as  contra a luz de tal modo que possam checar suas próprias respostas.

Ortografia é um outro tópico para o qual é igualmente simples, e desejável, que se deem  as folhas de autocorreção. A ortografia correta deve ser escrita numa fonte grande e legível, preferencialmente cursiva.

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3.2.3  Agrupar palavras em ‘famílias’

Uma vez que cada criança aprende do seu próprio modo, nem todas as técnicas operam igualmente bem para todas as crianças. Mas aqui vão algumas sugestões.

 

Usando  técnicas fônicas multissensoriais: é importante começar primeiro pelo ensino das correspondências regulares ‘letra’-som, a fim de estabelecer o sistema de decodificação.

Isto também se aplica a unidades maiores que são geralmente regulares, tais como o ataque:

<pr> em <prato>, <prego>, <compro>, …;

rimas:

<-ida> em <vida>, < comida >, <partida >, …;

<-ando> em <mostrando>, < lembrando>, <amando >, …;

<-ada > em < plantada >, <ornada>, <esmaltada >, …;

ou sílabas finais comuns:

<-ção> em < estação >, <menção>, <porção>, …;

-são > em < pensão >, <suspensão>, <tensão>, …;

Crianças com dislexia com frequência encontram dificuldade em espontaneamente detectar essas regularidades; esta é a razão pela qual é importante ensiná-las  explicitamente.

A técnica com frequência usada para leitura e ortografia é treinar alunos a sistematicamente agrupar as palavras em famílias,detectando padrões recorrentes e idealmente colocando-as em grupos, codificados pela cor; por exemplo, em palavras como <bato>, <mato> e <rato> ou <peões>, <anões> e <limões>, que contêm a mesma rima na fala e na escrita.

Esta técnica é importante, porque ajuda a análise fonológica e a memória.

Ela também desenvolve as habilidades metacognitivas de tal modo que quando os alunos chegam às palavras menos frequentes (por ex., <tato> ou <dispões>), eles estão aptos a fazerem associações com a família correspondente.

(1) Como primeiro passo, recomendamos apresentar aos alunos famílias de palavras – uma família por folha de papel – e pedir-lhes para circular ou sublinhar as similaridades; diga, então, quais partes das palavras são as mesmas, usando cores diferentes para cada família.

 (2) A seguir, você pode misturar as famílias de palavras que foram ensinadas e peça aos alunos que as reagrupem em famílias como no ‘Famílias Felizes’.

(3) Então, você introduz palavras que ainda não foram  ensinadas, mas que pertencem às famílias conhecidas.

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3.2.4  Segmentar palavras mais longas em unidades menores

 

Num momento dado, os alunos são confrontados com palavras mais longas e mais complexas.

Algumas crianças vão achar difícil ler essas palavras e entender como desmembrá-las em unidades menores.

Ensine às crianças como segmentar palavras complexas longas em unidades menores.

Você pode por essas palavras em pequenas fichas, pedindo às crianças para recortá-las com tesoura em unidades que possam manusear. Mais tarde, as palavras podem ser divididas usando um lápis.

Muitas crianças serão ajudadas se você ensiná-las a ‘esconder’ a parte da palavra usando uma tira da ficha ou seu polegar: o aluno esconde  ‘o final’ da palavra, focaliza  na primeira sílaba, que lê, então destapa a sílaba seguinte a ser lida e, assim, até o fim   da palavra.

Em adendo, as crianças podem marcar as palavras para ler. A marcação não apenas    ajudará a identificação, mas ajudará a memória de trabalho (retenção da partes já identificadas). Também liberará as fontes necessárias para a compreensão.

Ver este exemplo, retirado do Dyslexia Institute Learning Programme from Dyslexia Action, UK (Programa de Aprendizagem do Instituto de Dislexia da Ação Dislexia, RU):

Tome a palavra <psiquismo>.

  • sublinhar  o(s) grafema(s) complexo(s), i.e, com mais de uma letra, ou irregular(es) ( <qu>, <ps> )
  • destaque em amarelo as letras silenciosas ( <p> )
  • destaque em azul o prefixo ou sufixo ( <-ismo> )
  • e o resultado será  <psiqu-ismo>.

Para outras palavras:

  • circule as sílabas finais regulares que têm uma pronúncia similar ( <-ez>, <-são>, <ção> );
  • se as palavras tiverem um <c> ou <g>, então marque-as dizendo  [s] antes de <i> , <e>, <í>, <é>, ou <ê>, colocando um pequeno rabisco embaixo do <c>  para mostrar que ele se parece mais com <s> e é mais macio;
  • para o <g> antes de <i> , <e>, <í>, <é>, ou <ê>, por um ponto em cima dele de tal modo que ele se pareça mais com um <j>.

Obviamente, esta marcação não se aplica a palavras muito irregulares. Mas não perca de vista o fato de que, mesmo nestas, algumas partes de todas as palavras têm correspondências regulares, especialmente as consoantes, por exemplo: em <detêm>, todos os grafemas, com exceção de <ê> podem ser escritos por regras de conversão fonológico-grafêmicas. Somente <ê> precisa de uma regra de morfologia (3ª pessoa do plural do presente do indicativo).

Os  alunos devem ser ajudados a se apoiar  nessas associações regulares .

Pratique as palavras irregulares em intervalos frequentes e ofereça muitas oportunidades para que leiam na escola e no lar. Você também poderia montar um ‘pacote de leitura’ de palavras irregulares.

Crianças com uma boa memória visual se beneficiam ao verem palavras irregulares escritas em fichas.

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©Dr. Vincent Goetry e Dyslexia International (Versão Original)

©Dra. Ângela Maria Viera Pinheiro (Coordenação da tradução e adaptação da VB)