2. Princípios do ensino da alfabetização
2.2 Enfoques multissensoriais
Crianças com dislexia têm problemas para construir representações dos ‘sons’ das palavras faladas, i.e., fonemas, e então associá-las às ‘letras’, i.e., encontram dificuldades para representar e decodificar grafemas, das palavras escritas. Isso porque para elas é bastante complicado aprender a ler e a ortografar.
Em 1930, o Dr. Samuel Orton, nos EUA, observou que os aprendizes com dislexia tinham problemas na leitura e escrita quando ensinados pelos métodos ‘tradicionais’. Trabalhando com a premissa de que algumas conexões cerebrais, notadamente aquelas entre as áreas visual e auditiva, pudessem ser menos fortes nesses aprendizes, ele procurou um sistema de ensino que usasse outras áreas associativas do cérebro para ligar a área visual à auditiva. Ele pediu a Anna Gillingham e a uma equipe de professores experientes que concebessem um novo método para o ensino da fônica para aprendizes com dislexia.
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Técnicas multissensoriais para o ensino da alfabetização, agora denominadas o método Orton-Gillingham, surgem deste enfoque.
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Os métodos multissensoriais têm sido comprovados como os mais efetivos para crianças com dislexia e, ao mesmo tempo, beneficiam todas as crianças na aprendizagem da leitura.
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2.2.1 O que são os métodos multissensoriais?
As técnicas estabelecem uma associação estrita e simultânea entre o que os aprendizes com dislexia
veem na frente deles, a modalidade visual
o que eles ouvem, a modalidade auditiva
o que eles sentem ao redor da sua garganta e boca quando falam em voz alta, a modalidade oral-cinestésica
e o que sentem em sua mão quando escrevem cada grafema e palavra, a modalidade manual-cinestésica que inclui a memória dos movimentos feitos pelos músculos.
Quando ensina crianças com dislexia, você deveria tentar envolver essas quatro modalidades tanto quanto possível ao longo de todos os domínios.
Essas conexões melhoram a memória e a consciência:
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Aqui, Steve Chinn, um especialista em dificuldades de aprendizagem e ex-diretor de uma escola especializada, fala sobre ensino multissensorial.
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2.2.2 Características dos métodos multissensoriais
- Estruturados e sequenciais: introduzir o simples e frequente antes de passar para o complexo e menos comum, por exemplo, <v> e <i> antes de <x> e <s>.
- Cumulativos: cada novo ponto de aprendizagem se constrói sobre aquele ensinado antes.
- Baseados na análise fonológica: o aprendiz precisa adquirir uma consciência completa das unidades fonológicas: sílaba, ataque/rima e fonema.
O aprendiz deve ser apto a segmentar as palavras faladas em unidades menores para fazer as ligações entre fonemas e grafemas.
- Completos: cada passo deve ser completamente dominado antes de prosseguir para o passo seguinte. Esta insistência na ‘superaprendizagem’, à qual retornaremos mais adiante, é importante no ensino a crianças com dislexia.
- Treinamento da memória: os métodos multissensoriais ajudam a incentivar a memória e a recordação. Auxílios concretos à memória devem ser usados, tais como fichas de leitura, fichas de mapas mentais e mnemônica.
- Metacognitivos: o professor precisa encorajar os aprendizes a pensar sobre a forma como eles aprendem.
Os alunos deveriam ser conscientizados sobre como associar novos conceitos ao que eles aprenderam antes e então aprender como abordar uma nova tarefa, construindo sobre o que já tinham aprendido.
Os alunos deveriam ser conscientizados sobre a importância da auto-monitoria. Por exemplo, quando lessem um texto, deveriam saber que têm que parar aqui e ali para se perguntar: ‘Eu entendi isto?’ ‘A qual questão este parágrafo responde?’
Diagnóstico: os professores têm que se adaptar ao estilo e ritmo de seu ensino a fim de responder às necessidades e capacidades do aprendiz.
2.2.3 Passos a serem seguidos nos métodos fônicos multissensoriais
São estes:
- Você começa pelo ensino da consciência fonêmica e fonológica.
- Simultaneamente, você ensina as relações grafema-fonema, iniciando com uma só letra, por exemplo:
<v> ↔ /v/
Então, duas letras, por exemplo:
<ss> ↔ /s/
<rr> ↔ /R/
Exemplo de uma situação mais complicada:
<an> ↔ /ã/, em que o <n> tem que estar em final de sílaba, para formar com a letra <a> um só grafema (dígrafo), ou
<qu> ↔ /k/, só quando a letra <u> não tiver nenhum valor. Isto ocorre quando <qu> aparece antes de <e> ou <i> e as palavras têm que ser memorizadas no léxico ortográfico, com tal valor, pois o contexto é competitivo com a situação em que o <u> representa a semivogal /w/, como em ‘sequência”.
- As regras são construídas com respeito a restrições posicionais, por exemplo:
/s/, no início de vocábulo, antes das vogais posteriores, que se escrevem <u>, <o>, ou <a>, com ou sem acentos gráficos, é ortografado obrigatoriamente pela letra <s>, como em <suco>, <sono>, <sólido> e <samba> e
a semivogal /w/ nasalizada, em final de vocábulo se ortografa como <m> ou <o>, por exemplo, em <lavam> e <sótão>.
Formações ortográficas regulares são ensinadas a partir das mais frequentes até as menos frequentes:
<o> para /u/ em final de vocábulo, em sílaba átona, como em <livro> e
<e> para /i/ em final de vocábulo, em sílaba átona, como em <escreve>
<am> para /ãw/ em final de vocábulo, como em <cantam> e
<ão> para /ãw/ em final de vocábulo, como em <são>
Nos verbos, a escolha entre <am> e <ão> é condicionada: <am> quando em sílaba átona, como em <cantam>, <cantavam>, <cantaram> e <ão>, quando recebe a intensidade, como em <são>, <estão>, <cantarão>.
- Regras que envolvem mudanças na ortografia são ensinadas, na língua portuguesa, com base na origem etimológica, na derivação morfológica e nos princípios alfabéticos do português e devem ser ensinadas na seguinte ordem, a partir da frequência de uso:
– manter a mesma letra <s> ou <z> em toda a derivação, quando constarem como última consoante do radical, como em <quis>, <quisemos>, <quiseram>, <quisesse>, <quiser>, a partir de quiseste e como em <fiz>, <fizemos>, <fizeram>, <fizer>, a partir de fizeste;
– manter a mesma letra <s> ou <z> nos sufixos –ês, esa e ez, eza, em toda a derivação; ês, esa derivam adjetivos pátrios ou toponímicos, como, português, inglesa, francês e ez, eza derivam substantives abstratos como viuvez, beleza;
– <c> e sua variante <ç>, por exemplo: o verbo <esquecer> tem o final do radical grafado com a letra <c>. Esta letra <c> vai permanecer em toda a derivação, sempre que seguida das letras <e> e <i> (com ou sem acentos gráficos) que representam as vogais [-posteriores], conforme, <esquece>, <esqueci>, <esquecimento>, <esquecêramos>, <esquecê-los>. Porém se for seguida das letras <u>, <o>, <a> (com ou sem acentos gráficos), que representam as vogais [+posteriores], a letra <c>é substituída pela letra <ç>, pois do contrário, neste contexto, <c> teria o valor do fonema /k/, conforme <esqueço>, <esqueças>, <esqueçam>: a fidelidade ao fonema /s/ precisa ser mantida em toda a derivação. O que acabamos de explicar se aplica a todos os radicais que terminam pelo fonema /s/, na 2ª conjugação, representado, ora por <c>, ora por <ç>, conforme a regra acima, como nos verbos <adormecer>, <aquecer>, <entristecer>, <obedecer>, etc.;
– <g> antes de <u>, <o>, <a> (com ou sem acentos gráficos), como em <ligo>, <ligar> e <siga>, e <gu> com valor de /g/, antes de <e> ou <i>, como em <liguei>, <ligue>, <seguir> para manterem a fidelidade ao fonema /g/;
– <c> antes de <u>, <o>, <a> (com ou sem acentos gráficos) como em <fico>, <ficou>, <ficar>, e <qu> com valor de /k/, antes de <e> ou <i>, (com ou sem acentos gráficos), como em <fiquei>, para manterem a fidelidade ao fonema /k/.
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©Dr. Vincent Goetry e Dyslexia International (Versão Original)
©Dra. Ângela Maria Vieira Pinheiro (Coordenação da tradução e adaptação da VB)